Uma das coisas mais bacanas que me aconteceu nos últimos tempos eu pouco comentei nas redes sociais. Sinto que existe um processo bem profundo relacionado a isso,que eu pouco ou quase nada me senti inspirada a falar sobre até agora, mas que sinto que precisa sair. Como se eu fosse capaz de colocar meu cérebro para fora do meu corpo e analisá-lo de fora, todos os meus processos de autocompreensão mais significativos acontecem assim: falando.
Então: é hora.
Há pouco mais de um mês recebi meu Sannyas – meu nome espiritual. Se você não sabe o que isso significa, um breve resumo é o de que na antiga tradição hindu, uma pessoa recebia seu Sannyas quando renunciava aos Ashramas – estágios de vida baseados na idade, nas experiências pessoas e na identificação com o Ego. Ao receber o sannyas, um novo nome, o buscador renascia para uma nova vida.
Hoje em dia, com a popularização e a difusão dos conhecimentos e práticas espirituais orientais pelo mundo ocidental, o Sannyas tornou-se disponível a qualquer pessoa que, segundo Osho, “escolhe viver a vida em sua totalidade, mas com duas absolutas condições, categóricas: consciência e meditação”.
Eu já vinha namorando a ideia de receber Sannyas há um ano. Desde que me tornara mais íntima de Osho e seus ensinamentos através de minha amada Mestra Upadhi, vinha refletindo sobre este importante passo na minha jornada espiritual.
Na verdade, já há alguns anos tinha consciência de que as identificações da minha mente com a minha identidade me traziam, em alguns momentos, sofrimento. “Flavia Melissa”, de meu nome, passou a ser o nome de meu trabalho – de minha empresa – e esta identificação passou a fazer com que transformações pessoais adquirissem um peso muito maior do que inicialmente deveriam ter.
É como se, de repente, eu não pudesse mais ser apenas um ser humano na própria jornada. Absolutamente ninguém me exigia isso a não ser eu, veja bem. Mas, de uma hora para a outra, passei a sentir o peso do mundo em minhas costas, cercada de pessoas que trabalhavam no mesmo ramo que eu e que se mostravam tão perfeitas e decididas em tudo. Era como se eu não pudesse ser quem eu era, se não seria engolida “pela concorrência”. Uma vez, um “colega” do meio digital me disse, numa brincadeira aparentemente inocente: “você ainda é uma gatinha da internet; mas este é um ringue em que só leões têm vez”.
Eu, então, me passei a cobrar ser leão.
Só que todo o meu processo pessoal me levava na direção oposto deste “mostrar os dentes”. Quanto mais eu caminhava na direção de ser quem eu era, me tornando consciente de cada uma de minhas partes e trabalhando ativamente para a minha autoaceitação, menos eu passei a me identificar com este “ringue”. Meus processos pessoais com a maternidade, iniciados até mesmo há mais de 3 anos, antes do nascimento de Gael, me confrontavam dia após dia com aspectos extremamente imaturos e infantis meus, e a única forma de eu continuar no jogo de “ser leão” seria começar a fingir ser algo que eu não era.
E isso era impossível para mim.
Muitas pessoas “amigas” foram levadas neste processo. Muitas vezes, pensei em seguir o exemplo de minha grande e amada irmã de jornada Ari Schlösser, e tirar um período sabático. Na verdade, passei muitas vezes perto de simplesmente deletar meu canal do YouTube e minhas redes sociais. Voltar a atender os pacientes que sei que gostariam de retomar seus atendimentos e me tornar novamente uma psicóloga anônima, mãe de família, que trabalhava no horário comercial.
Mas eu sempre soube que isso seria apenas uma fuga.
E, então, há um ano eu me dei conta de todo esse processo, que já estava quase se tornando um burn out, quando fui para a Osheanic passar 10 dias em companhia de Upadhi, no treinamento nível 1 de OPH. De repente me dei conta de todos estes movimentos e comecei a flertar com a possibilidade de mudar de rota. O caminho do Sannyas começou a se apresentar como uma possibilidade cada vez mais real, mas ainda restavam muitas dúvidas, principalmente pelo fato de todo o meu trabalho ser estruturado em torno do meu nome de batismo. Como seria isso? De um dia para o outro mudaria de nome? Mudaria tudo?
Mas, mais uma vez, nas palavras do Mestre Osho, “É sua decisão. Se você é um Sannyasin, é sua decisão. Se você abandona o Sannyas, é sua decisão. Se você tomá-lo de novo, é sua decisão. Eu deixo tudo com você”.
E, então, eu decidi.
Em julho deste ano, fui para a Osheanic para mais 10 dias em companhia de minha Mestra Amada, na parte 2 do treinamento. Eu tomaria Sannyas. Mas eu não me sentia confortável e nem tinha vontade de ser eu a escolher este nome – baseado em quê eu escolheria um novo nome? Em meu próprio Ego e suas distorções do que é? E então eu disse à Upadhi que gostaria que ela escolhesse meu nome, da mesma forma que Mestre Osho havia escolhido o seu.
E, então, ela me perguntou: “Por que você quer receber Sannyas?”. Lágrimas grossas vieram aos meus olhos, e eu respondi, com muita sinceridade, que o Sannyas, para mim, era como uma de minhas tatuagens: cada uma delas serve para me lembrar de algo. O caminho para um lugar mais correto, que minha alma sabe que faz sentido seguir, ainda que meu Ego questione. Poucas pessoas me conheciam tão bem quanto Upadhi, e ninguém seria melhor do que ela para escolher meu nome.
Na noite de 21 de julho de 2018, me tornei Ma Prem Rani – o significado é “Rainha do Amor”. E quando Upadhi disse as palavras, meu ser inteiro tremeu, porque por toda a minha vida é isso o que eu venho buscando: o amor. De maneiras tortas, quase sempre extremamente sofridas, distorcidas. Mas sempre foi esta busca, a busca do amor.
Quando eu era criança e fazia de tudo para agradar meus amiguinhos.
Quando eu me tornei adolescente e desenvolvi um transtorno alimentar.
Quando eu virei adulta e camuflava fragilidades em busca de aprovação.
O que esteve em jogo sempre foi o amor.
Quando eu me ajoelhei aos pés do mestre e vesti o mala, aceitei meu Sannyas como uma jornada de vida – eu sempre repeti que nossa maior missão era, parafraseando Rumi, “encontrar todas as barreiras que nós construímos entre nós e o amor e, então, destruí-las”, mas nunca havia verdadeiramente sentido este caminho vibrando em minhas células.
E hoje, passados dois meses, este caminho dói.
Tenho compartilhado nas redes sociais um desafio muito grande que estou vivendo nos últimos tempos, que é o processo de adoecimento de uma de minhas melhores amigas, a Gi. Se você não sabe do que estou falando, acesse meu perfil no Instagram (inserir link: instagram.com/flaviamelissa) e assista aos Stories em destaque com o nome “Mutirão da Gi”. Tem sido um processo sofrido, muito sofrido. E uma das coisas que eu mais tenho encontrado dificuldade é vivenciá-lo ao mesmo tempo em que celebro a vida através de minha nova gestação.
Neste último domingo, voltando para casa de uma visita a ela, me dei conta. Esta não é a primeira vez que experimento esta contradição de celebrar a vida enquanto a morte passa tão perto de uma pessoa amada. Também em minha gravidez do Gael, meu primeiro filho, vivi processo semelhante porque outra de minhas melhores amigas, Fernanda, estava também enfrentando o câncer. Até fiz uma postagem sobre esta constatação, que você acessa clicando aqui.
Um dos comentários me chamou a atenção por ser exatamente a mesma frase que a Gi havia me dito no domingo: “a gente não tem controle de nada nessa vida”. E, de repente, a ficha caiu que nem um iceberg na minha cabeça.
Porque o controle é o oposto do amor.
A mente tenta controlar tudo o tempo todo porque sente medo, e o medo é justamente o oposto do amor. Enquanto todo o nosso ser diz SIM quando amamos, quando tememos todo o nosso corpo diz NÃO – e então vem ela, a necessidade de controle. Para que aquilo que eu temo não aconteça, para que eu não sofra, para que meus piores pesadelos não se tornem realidade.
O medo é o oposto do amor, e eu venho sentindo medo há tanto, tanto tempo.
Medo de não ser amada, medo de não ser valorizada, medo de meus projetos não darem certo. Medo de tentar e fracassar, medo de não ser uma boa mãe para meus filhos, medo de que eles não se dêem bem. Medo de perder minha melhor amiga… Medo.
Ao mesmo tempo em que todas as células do meu corpo dizem sim e se multiplicam. Ao mesmo tempo em que meu útero diz sim e se expande. Ao mesmo tempo em que meu quadril diz sim e já se abre, porque eu já sinto isso acontecendo, ao mesmo tempo!
Como pode ser possível, a mente dizer não e o corpo dizer sim?
“A mente mente, o corpo fala a verdade”, já disse alguém (muito) sábio. A minha natureza é o amor, assim como a sua, e a única coisa que nos impede de dar um SIM definitivo à vida são nossas mentes e necessidade de controle. Minha Mestra me presenteou com esta linda jornada, a de me tornar Rainha do Amor, e ela entendeu antes mesmo que eu entendesse que este é o meu caminho.
E pode ser o seu também. Basta que nos foquemos no que é verdadeiramente importante e permitamos que o amor seja a nossa bússola e o nosso mapa.
Minha próxima tatuagem vai ser uma frase; em todos os seus conflitos e medos, pergunte-se sempre: “O que o Amor faria?”